A censura corta. O humor brasileiro, piada da desgraça ‘pudica’. “Temos de rir pra não chorar”

O povo brasileiro foi imbatível em percepções bem-humoradas, traduzidas em imagens e frases. Mas me questiono se somos tão bons nisso porque já estamos acostumados a fazer piada com a nossa própria desgraça.

As mulheres brilharam nestas Olimpíadas, mas sabe quem mais foi medalha de ouro? O povo brasileiro e os memes. Para além das transmissões oficiais, centenas de pessoas tiveram percepções bem humoradas de momentos e cenas específicas dos Jogos, traduzidas em imagens e frases sobrepostas. É uma comunicação eficaz, que fala direto com quem não assistiu às competições na íntegra e, principalmente, com os jovens.

Nenhum outro país gerou a quantidade de comentários, informações e teve impacto similar ao Brasil nesse sentido.

Me questiono se somos tão bons nisso pois já estamos acostumados a fazer piada com a nossa própria desgraça, ou se tem relação com sermos latinos e nos conectarmos melhor com uma gama extensa de sentimentos (mesmo sem saber lidar muito bem com eles às vezes). Nós vamos da indignação coletiva com um julgamento injusto até o encontro de um significado num tombo com supercílio cortado. Tudo é transformando em algo a mais.

A árvore genealógica de pódios, que começou com a foto do Medina e foi virando uma mera piada, para mim é de um humor extremamente perspicaz. Ao mesmo tempo que nos informa sobre o quadro de medalhas, joga na nossa cara a dificuldade de sobreviver no esporte e como a sustentação é frágil.

Comunicamos os ídolos improváveis, como o skatista Japinha com seus malabares, Flavinha da ginástica em seus inúmeros momentos de irreverência, e o funcionário de sunga chamativa da natação.

Ficamos sabendo do choro da judoca japonesa, da maratona da Ana Sátila nos milhares de provas que disputou, da sujeira do rio Sena e do atirador turco que não usa equipamentos modernos.

Eu particularmente acompanhei mais pelo compilado de carrossel dos perfis que sigo do que por qualquer outro lugar. Fazer a curadoria certa também é um talento.

Tivemos também o jornalismo independente, alguns jornalistas e influenciadores que transformaram seus perfis em noticiário olímpico, trazendo informação e entretenimento de graça.

Talvez, no fim, seja um pouco o reflexo da nossa essência brasileira. Ninguém torce como a gente. Ninguém se diverte como a gente.

Folha de S.Paulo12 Agosto de 2024
Por: Karen JonzK

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